Alguém um dia desses me disse que La Poste, os correios daqui, é a segunda empresa mais admirada pelos franceses. Esse mesmo alguém não sabia dizer qual era a primeira, e gastamos um tempo besta, sô, especulando se era o McDonalds, McDô pra eles, o Starbucks ou alguma outra rede americana. É claro que não chegamos a lugar algum, mas ao menos arrumamos uma desculpa para algumas cervejas.
A verdade é que La Poste é para os franceses muito mais do que uma empresa que entrega cartas. É uma instituição. Uma mamma italiana, uma polka tcheca, uma vaca indiana, um ensopado de cachorro chinês. Bom, esqueçam o ensopado, não foi um bom exemplo. Enfim, La Poste é uma entidade da qual eles não podem ser dissociados.
É uma relação que beira o protecionismo, como a mamãe ganso que cuida das crias. Os franceses não apenas gostam de usar La Poste, eles fazem questão de arrumar utilidades para ela. Por exemplo, vai tentar resolver as tarefas bancárias mais básicas pelo telefone.
- Madame, estou ligando para avisar que mudei de endereço, e gostaria que você atualizasse meu cadastro.
- Manda uma carta dizendo de onde saiu e pra onde foi.
- Mas eu posso falar pelo...
- Uma carta.
- Vai ser rápido.
- Cê a erre tê a.
- ÉfácilmeunomeéDanieleeumudeiparaarua...
- Carta! Carta! Carta!
Ou então um pedido de demissão, que só é aceito se você enviar uma correspondência à empresa.
- Não aguento mais essa exploração, eu me demito!
- Como é que é?
- Eu me demito!
- Mandou uma carta?
- Não, ainda não. É que...
- Então senta esse maldito traseiro aí. E não esqueça: o relatório é pra hoje, Christophe.
- D'accord, d'accord.
Mesmo já estando há mais de dois anos em Paris, não faz muito tempo que entendi realmente o que significa esse totem francês. Foi quando estava em uma agência de La Poste, colocando moedas em uma máquina que imprime os selos na hora, e um senhor, barbudo e bem velho, chegou pedindo meu auxílio.
- Você pode me ajudar? Eu preciso comprar um selo, mas não sei usar essas máquinas modernas.
- Bien sûr, monsieur. Qual valor?
- Ah, é pra uma carta básica.
Comprei o selo e ajudei o senhor a colá-lo no lugar certo. Ele abriu um sorriso sem tamanho, disse que sua filha esperava ansiosamente pela correspondência. Fiquei feliz por ele e pela filha, mas achei meio estranho quando vi através do branco do envelope um cupom escrito "enlarge your penis" em letras garrafais. Vive La Poste, quand même!
Há 2 dias