sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Argentina! Argentina!


Em viagem aos Estados Unidos, um grupo de amigos do qual faz parte Ronald Walker combinou o seguinte código: nas intermináveis visitas a shoppings e centros comerciais, quando se perdessem uns dos outros, levantariam a mão e gritariam "Argentina! Argentina!" com força. Assim, além de se encontrarem mais facilmente, contribuiriam para a difamação da terra de Maradona, alimentando um pouco mais a bem humorada peleja que travamos eternamente com nossos vizinhos.

Essa pequena história contextualiza a que vem a seguir.

Como o inverno tá chegando, o novo endereço da pelada do Paristeama é um campo sintético, coberto e cobrado. Fica longe pacas, depois de onde Judas perdeu as chuteiras. Então combinamos de nos encontrarmos em Bastille para fazer o trajeto de metrô de quase uma hora juntos. Normalmente vamos em pé, mas um dia desses conseguimos pegar um vagão vazio e sentamos em cadeiras viradas umas pras outras, ambiente propício para uma conversa animada. Claro que o assunto não poderia ser outro se não futebol: comentários sobre nossa última partida, o campeonato brasileiro e o vídeo mostrando o Ronaldinho Gaúcho tocando pagode em Paris com um dos atacantes do nosso time. O clima era de mesa de boteco. Só faltava mesmo abrir umas cervejas e pedir pro Márcio (conheço bem uns 10 garçons que se chamam Márcio) trazer uma nova porção de pastéis.

O papo seguia descontraído e certamente alguns decibéis acima de um dos critérios estabelecidos pelo PaPaI, o Padrão Parisiense de Inverno. O curioso é que mesmo sendo um padrão, o PaPaI é variável. Provavelmente pelo fato de ter sido elaborado por um brasileiro, eu mesmo. Tratarei dele com mais detalhes em um texto futuro. Por ora basta saber que quanto mais frio faz, mais o Parisiense fica ranzinza. E a relação parece ser recíproca, pois quanto mais o Parisiense fica ranzinza, mais frio faz.

Nesse dia os termômetros deviam marcar uns 10ºC e todos os passageiros portavam seus grossos casacos. Uns liam os jornais e bufavam, outros conversavam com amigos e bufavam. E ainda havia aqueles que só bufavam, como uma senhora acompanhada de uma criança pequena, sentada perto da gente. A cada elevação do nosso tom de voz, ela nos olhava com cara de entediada e expirava o ar pelas ventas com grande vontade.

Acontece que assim como a gente ela seguiu no metrô até o último ponto da linha. E quando o trem preparava-se para chegar à estação final, com o volume da conversa já bem elevado, ela não resistiu e interveio.

- Mas como vocês gritam, hein?

Alguém do nosso grupo começou um discurso sobre o mau humor francês, que não pareceu emocionar a senhora. Mas um outro, também amigo de Ronald Walker, teve a grande sacada que comandou o resto da conversa. Ao mesmo tempo que soube lidar com a dona reclamona, escreveu mais um capítulo da eterna e recíproca provocação com o país de Juan e Evita Perón.

- Desculpe, senhora. Não deu pra controlar. É que no nosso país a gente fala alto mesmo.
- Mas aqui tem que ter respeito.
- O problema é que na Argentina, de onde viemos, estamos acostumados a gritar. - Disse, reforçando o "Argentina".
- Só que a França não é a Argentina.
- Sentimos muito. Mas nós, argentinos, não conseguimos nos controlar. - E saiu do vagão gritando "Argentina! Argentina!".

O próximo passo já está decidido: aprender o hino.

12 comentários:

Luhu disse...

Que sacanagem! Pô, Dani, um amigo meu argentino me ligou no dia em que o Brasil venceu a copa do mundo pra me parabenizar! O texto tá engraçado, mas não gosto dessas rivalidades, não.
Com afeto,
Lu

Anônimo disse...

Brasileiros no exterior = FAIL

Cynthia Le Bourlegat disse...

Engraçado ler seu post. Quando estudei na França há dez anos atrás, o grupo de brasileiros que foi comigo tinha o costume de gritar" argentina" quando um dos integrantes cometia alguma gafe em lugares públicos...

Soy yo disse...

Daniel,
Soi yo, tu Pápi.
Tudo bem. É só não mexer com o Conca -- o "hermano" do bem --, que o Flu tá precisando um bocado dele nestes tempos de horror e de "vendetta" (contra a tal LDU do Equador).

ML disse...

Fazia tempo que o sr não estava tão engraçado... ri de verdade, apesar de saber o final :)

o tô com o teu Pai, Conca é seleção!

Não importa disse...

Ehehehe... mas é um sacana.
Tenho nada contra argentinos, ainda, porque não conheço nenhum.

Jú Fuscaldi Rebouças disse...

Não consigo não comentar. Seus textos sempre me fazer rir muito.

Só discordo de uma coisa: não é só quando faz frio que o francês fica ranzinza. Hahaha

Parabéns (de novo e de novo e de novo) pelo texto (mais uma vez) ótimo!

Abs da "leitora mais fiel" (:

(Ah! Não sei se mudou esses dias, mas só agora fui ver que o "X comentários" foi substituído por "X Uh la las". Bem francês. Adorei!)

Maybi disse...

Sempre acompanho seus posts. Gosto muito de todos, mas este particularmente me fez rir muito. Quero aproveitar para comentar outro post. Aquele sobre jogar pelada com o Chico eu achei que era estória... inventadinha inventadinha. Algumas horas depois, no Facebook, uma amiga de Paris que fez intercâmbio aqui em São Paulo postou fotos com o Chico no dia do jogo de vcs... Restou-me lembrar como o mundo é pequeno...

debora blog disse...

Daniel,
grande texto. Qualquer ação planejada para prejudicar ou denegrir a imagem dos nossos arqui-rivais portenhos deve ser sempre louvada por qualquer brasileiro que se preze. Infelizmente, tenho um fraco por alfajores, doce de leite e filmes argentinos mas se não fosse por isso, por mim a gente invadiria, destruiria, cimentaria e transformaria a Argentina em estacionamento para o Rio Grande do Sul. Você não acha? Continue escrevendo, amore.

Bjs, Débora

Chéri disse...

Olá, pessoal. Valeu pela visita e pelos comentários.

Lu, não tem rivalidade não. Isso é coisa do Galvão Bueno, pra aumentar audiência na TV. Eu também tenho um amigo argentino que me mandou uma cordial mensagem em 2006, após o jogo contra a França: "que la chupen".

Pápi, Conca tá mesmo jogando muito. Mas prefiro um outro gringo, o Petkovic.

Débora, também não precisa exagerar. É tudo brincadeira com os argentinos, assim como eles fazem com a gente. Afinal, o que seriam dos vendedores de picolés de Floripa se não fossem os hermanos?

Unknown disse...

Texto, como sempre muito bom! E como se não bastasse, os comentários também são de chorar de rir... O da Débora ficou muito engraçado! Transformar a Argentina em estacionamento do RS?! kkkkkkkk Mas o que seriam dos Alfajores?!!!
Bjs!

Amuná Djapá disse...

até simpatizei com os argentinos agora